edição 50 | abril de 2016
nenhuma dor
Na árvore de esqueletos paginada por folhas secas a morte é a última trégua para a dor Preciso enriquecer os bosques de frutos desdizer a aurora distante da dor A vida é um mistério da felicidade acendendo uma vela parida pelo sol Nenhuma dor é possível para quem se entrega à vida vida que vagueia na equação de zeros A silenciosa entrega para a insônia dos anos que detesta o acender dos copos dos bêbedos O corte se cicatriza pelo verbo, pela palavra alimentada sem ser costurada pela fome Os esqueletos descem daquela árvore do bem e do mal negam o antagonismo da luz e da sombra e se carnalizam pelo néctar da vivência Mas a vivência não é experienciar o vazio a serena escada que corta o limite entre a terra e o céu? A dor é um corte no fruto saboroso é apodrecer as coisas belas do instante Os insights são os desejos desacostumados dos séculos o esquecimento das noites e dos dias o desvestir de roupas amarrotadas pela experiência Quero desaprender o verbo noturno a solaridade das metáforas mais belas Quero acordar de todas as memórias e deixá-las como pesadelos secos de uma mente estrangeira Amanhã não será mais amanhã, mas o hoje que desfaz a dor em segredo E nem o prazer os satisfazem pois o oposto é apenas um velho encardido, um irmão coxo Os opostos não se atraem e nem se renegam simplesmente não existem como a dor do féretro.
a morte do centauro
No lago, um golpe de machado Feito de céu e terra ele se fragmenta em dois fazendo suas partes desiguais voltarem aos seus originais habitats Metade água, metade fogo o homem tenta construir em vão um centauro de argila querendo imitar a sua complacência de animal espiritual Sabedoria dos anos, em sua natureza plena derrama o sangue vivo dos ensinamentos acumulados como livros de mistérios Em seu último gemido, deixa o grito se escoar pelas águas levando da constância o caminho para o vazio De terra, de céu, de fogo e de água os homens e os centauros se igualam no seu vazio inaugural Após aquela ceia de morte, a vida e a morte se igualam Não há nada que limpe aquela mancha na terra Só resta ao homem ultrapassar o sangue e a própria morte que o centauro deixara ali como lembrança de vida.
dos utensílios ocos
Percorro aqueles recipientes nos cantos da casa escondidos das fumaças do mundo Por dentro, ocos cemitérios, sem corpos ou almas vazios que não aceitam o líquido de nossa queda em matéria divinamente petrificada pela maldita argúcia do tempo Quebro aqueles utensílios ocos, na sua morte estúpida O esvaziamento do vazio me inebria O vinho raro não consegue seu espaço nos vasos bem talhados Um cão late naquela noite de estrelas pálidas Oco é o delírio de não vagar pelo mundo como fantasma das horas Ultrapassando as rédeas estrangeiras o homem está só na sua quietude silenciosa Os utensílios ocos nem servem mais para suas meditações só a dilatação das esperas o contagia sem contar os minutos que derrotam o vazio.
Alexandra Vieira de Almeida é poeta, contista, cronista, ensaísta e resenhista. É professora da SEEDUC e tutora de ensino superior à distância na UFF. Tem Doutorado em Literatura Comparada (UERJ). Tem quatro livros de poemas publicados: 40 poemas, Painel (Multifoco, 2011), Oferta (Scortecci, 2014) e Dormindo no verbo (Penalux, 2016). Publica constantemente em antologias, revistas, jornais, alternativos e sites por todo Brasil e também no exterior. Tem um blogue de literatura: www.malabarismospoeticos.blogspot.com.br.
onde [où – trad. flávia de carvalho bretas]
onde me arrancaram todos os pés sob o pretexto da sobrevivência caíram-me as falas, os argumentos nasceram esses braços no lugar (e essa poda diária nos dedos).
onde me arrancaram todas que fui é onde pude ser outra e uma a mais arrastando casas com meus cabelos trazendo nas corcovas a reserva (de bocas secas, amargas sem beijo).
onde me arrancaram todos os brotos cresceram-me essas crostas de dragão esses espinhos como que armaduras e essas rosas secretas e feias (roubadas num pesadelo de shopping).
onde me arrancaram todas as odes páginas rasuradas, as melhores a mulher calcinada no rescaldo ainda ativa em óperas insones (os incêndios das coisas como são).
onde mesmo a amputação me arrancaram próteses c'as quais já me acostumei as versões da história ganhando a história as botas dos homens sujos de novo (mas um desprezo sutil aprendi).
onde me arrancaram todos os nós sobram os nodos da garganta e dos seios soluços breves contra o travesseiro e aquele aceno breve educado (pelo que já não sinto por você).
Anna Caye é o pseudônimo poético de Amelie Blanche McKinney, escritora francesa (Le Pont Mirabeu, 1952) autora de Après la pluie (Gallimard Folio, 1983) livro sobre os movimentos de maio de 1968 em Paris. Todos os poemas até hoje produzidos por Amelie são creditados a Anna Caye, uma espécie de alter ego lírico da autora.
marcelina kowalczyk dos santos
dez coisas que marcelina kowalczyk dos santos fazia todos os dias antes de morrer
Vasculhava os horóscopos antigos em busca de pelo menos uma previsão errada. Escrevia pelo menos uma carta a Cauby Peixoto sem nunca repetir o tratamento. Esquecia onde deixava as roupas para usar depois do banho e andava nua pela casa. Descascava pêssegos com as unhas dos dedos anelares. Olhava as latas sem rótulo e sorteava às cegas o que comer. Imitava olhos de gato no espelho e latia, para treinar o cérebro. Empilhava fotos antigas no fundo do formigueiro de estimação. Ensaiava frases sem nenhum sentido. Fazia caras que imitavam emoções de memória. Fingia-se de louca.
a última noite de amor de marcelina kowalczyk dos santos
quero ouvir meu cauby mas pode ser seu glenn miller quero beber vermute mas pode ser guaraná
não me chame de polaca
quero que você os ponha para dormir mas pode me deixar esquecê-los? quero as frutas doces e as promessas mas eu aguento até as mentiras
não me chame de polaca
essa ainda é sua melhor figura? mas pode tentar melhorar? quero um homem de verdade mas pode ser você
não me chame de polac...
anotações póstumas do fantasma marcelina kowalczyk dos santos
cada pedaço meu espalhado o coração já estava espatifado mesmo as memórias cheias de inchaços meu corpo dilacerado adentro
lembranças infames circulando nas veias das pernas e dos braços o amontoado de velas no chão
essa minha casa sempre foi um precipício é onde sempre deixei escondidos todos os meus desperdícios
os dias sempre tão longos e as tardes cheias de calma e sossego despindo-me na alfombra vibravam-me sem desespero
para os outros eu era quem guardava palavras somente até minha voz ser guardada debaixo de um travesseiro
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se voltarei em eventuais aparições? o que teria a ganhar com isso? melhor sumir para sempre — existir é bem mais difícil
a casa sem mim tem espaços mais amplos do que antes não percorrera (o ficus já adentrou o algibe profundo onde ele jamais coubera?)
os quartos nos corredores estão cheios de lembranças só minhas ninguém pode entender de verdade o que era estar aqui e sozinha
há uma parte de morrer que ninguém sabe porque daqui nunca alguém quis voltar somente por ser invocada a dizer entendi porque me quiseram matar
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onde deixei o meu terço? que fim levaram, da janela, os trilhos? a estrada da qual desci nesse lugar me levaria de volta a um princípio?
— é uma bobagem imensa pensar assim eu sei, quem não sabe? agora não mais ficarei nem que me implorem filhos ou netos
afinal onde eles foram parar? se era para não verem como eu estava até ontem agora já podem voltar
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que tomem conta da horta nos fundos do pátio que o mato tenta abocanhar de uma vez mas como não posso mais escrever a quem me ouve eu ainda queria dizer:
depois já podem ir esquecendo de mim porque não tenho pressa alguma em saber das suas vidas o que virá ou não a acontecer
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mas nada de arrastar de correntes eu sempre fui a mais velha — que eu ainda me lembre — de todos os meus parentes
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de agora em diante, acertemos, deixem tudo bem diferente e eu não lhes deixo meus danos
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saibam que esse que me matou e vocês amam foi mesmo um belo de um salafrário
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desejo a vocês todos, de vida, no mínimo uns duzentos anos
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agora eu já vou
Marcelina Kowalczyk dos Santos nasceu e morreu em União da Vitória, Paraná. Seus escritos esparsos foram recolhidos pelos seus descendentes, redigidos no lado interno de pacotes de farinha de trigo e rótulos de compotas, todos mantidos dentro de uma pequena caixa de metal guardada por centenas de formigas operárias.
instantâneo milagre
"não tem mal nem maldição" é veneno sem bula não tem cura nem cunho é sereno tempestuoso casto da lágrima miserável castigo do leite derramado travestido de efemeridade teu peito é ponta de lança som do osso mordendo a vida teu peito é porto de vingança ponta da faca trovando o abismo o destino o desígnio o arbítrio a nada se entrega a tudo se enfrenta de luzir poroso de mirar rasante teus olhos carregam cicatrizes acuradas feridas consumadas pela consciência do não-ser sem cara alma ou identidade eis a mentira a verdade o suspense o gosto do gosto que ninguém explica eis o instantâneo milagre do suspiro o imediato agora que ninguém percebe.
tempo há
na boca dos olhos no peito dos sonhos nos poros do estômago bandida a pele saca o desejo armado o desejo atiça o afeto ouriçado o afeto despe a vontade movido contraditoriamente todo o tudo trova o poema o verso o verbo o veneno torpe razão que deleita o inconsciente denuncia a carne e mente o sentimento ao fim resta-nos o último pedido: ama-me há tempo — é tempo ainda!
o bote
a vida é um corte que sempre sangra e não nos mata entre os punhos ocos os socos os ócios os pulsos e os ossos no tamborilar dos silêncios onde o corpo se põe e se opõe prenhe de avessos prenhe de inércias a vida é uma eterna morte doer, dói invariavelmente feito faca sem gume o tempo mastiga a memória o vazio a angústia onde arrancaram de mim todos os pés os caules as raízes amputado do próprio corpo deixaram-me o coração na mão à deriva o que me salva é a poesia
Nayara Fernandes (Teresina/PI, 1988). É autora do poema "Asas de Pedra", lançado em novembro de 2015 na coletânea Quebras — uma viagem literária pelo Brasil. Publicou nas revistas Mallarmargens e The São Paulo Times. Mais: nayarafernandes.wordpress.com.
prelúdio
antes que morra preciso te contar um segredo: não há mistério não há paraíso apenas o corpo embolorado alimentando vermes
dobras
devo dizer que perdi uns quilos hoje perdi todos os quilos do meu corpo olhei no espelho retalhei a barriga quem sabe um dia olharão pra barriga e não haverá cicatriz retalho todos os dias pedaços do meu corpo anormal deformado desagradável oco
Pilar Bu (Rio de janeiro/RJ, 1983) é poeta, mestranda em literatura, triplo-fogo do zodíaco, feminista e assumidamente viciada em carnaval. Mora em Goiânia, na Toca dos Vampiros, com seus gatos. É co-criadora do coletivo Minaescriba e mediadora do Leia Mulheres em Goiânia. Já publicou em algumas revistas eletrônicas e lança seu primeiro livro, Ultraviolenta, em 2016. Escreve o blogue https://ultrapilarbu.wordpress.com.
GT
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Fiquei visivelmente sem graça quando ele disse acreditar que a língua tem pelo menos umas 4 ou 5 funções diferentes
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acho que ficou no meio do caminho né, não chegou a ser deselegante, eu acho
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Escrever um poema enumerando todas as funções da língua que me venham à cabeça
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Disse que é cansativo não se deixar envolver que é preciso estar presente e ao mesmo tempo atento como quem escuta sons ao invés de palavras sem com isso perder de vista significados e não prestei mais atenção ao que ele dizia tentando ouvir os sons que saíam daquela boca tão pequena dentinhos firmes me perdi imaginando como seria beijar a boquinha que emite sons tão próprios chegar tão perto quanto possível da sua laringe garganta e todo aparato que se revela naqueles exatos sons gestos e não outros me detive olhos acompanhando o movimento de seus dentinhos os vestígios de sua língua tão proporcional à sua boquinha queria o gosto da sua saliva e pensei será que beija só com os lábios e guarda a língua me parece tão pequena a linguinha será que precisaria caçá-la ou será que para minha surpresa faria movimentos circulares em torno da minha
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não curto envolvimento sexual com quem acabou de sair de uma relação mas podemos ser amigos só pra ser bem honesta com você caso você esteja querendo uns beijos também
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Já imaginou como é passar a vida assistindo filmes sem legenda ver discos voadores passando por cima do cristo redentor cinco cariocas se unindo para salvar o mundo em naves espaciais decolando do pão de açúcar monstros escalando o edifício central zumbis arrastando suas tripas pelo aterro do flamengo isso deve gerar sintomas isso com certeza gera sintomas a princípio não captei o estranhamento até que me atropelam as imagens e penso caramba so many ways to be fucked up
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Eu disse apagaram Bento Rodrigues do mapa você viu apagaram mesmo tiraram as coordenadas do mapa o nome da cidade ele complementou mas antes apagaram Bento Rodrigues fora do mapa mais estranho do que uma cidade desaparecer é uma cidade ser engolida por outra cidade foi assim com o rio na época da expansão várias cidades foram engolidas o que pra mim é mais estranho do que desaparecerem mas eu não estive presente em nenhum desses momentos eu vi Bento Rodrigues sumir eu vivi Bento Rodrigues sumir ele diz te entendo
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Dorme aqui amanhã Ele disse amanhã de manhã te aviso certinho Nenhuma mensagem pela manhã Nem pela tarde Menos ainda à noite Ou nas outras 35 noites seguintes
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Se quisesse agradá-lo colocaria o vinho que ele comprou na geladeira mas ele não vai mais caminhar entre a geladeira e o quarto ele não vai mais levar o cigarro à boca enquanto faz confissões à cama e sorri pra mim
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O término não precisa ser fiel ao término além do mais o segundo dia do ano se inicia e prometi a mim mesma que esse seria o ano que nenhum homem me chatearia e como sair chateada com um poema debaixo do braço não é mesmo
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A não ser que esteja muito calor
*
Escrevo para te dizer que não tem acontecido nada e passo os dias tomando café ao som do Estrangeiro e tenho procurado emprego e não recebido resposta e tenho prorrogado comprar uma garrafa térmica porque derrubei a antiga e faço aqui uma pequena ressalva: tenho tomado café frio. Quem virá com a nova brisa que penetra pelas frestas do meu ninho quem insiste em anunciar-se no desejo? Toda semana decido ir diante da tua árvore para conversarmos a sós e lembro que tal árvore não existe apenas em algum poema que li e pensei que seria útil se você também tivesse uma e eu pudesse usar uns tempos verbais antiquados pra falar da tua árvore e como me prostro diante do teu signo e sinto tua vida pulsando na sola dos pés. Escrevo pela última vez para anunciar o desejo que me mandes um mapa ou pergaminho falso para que o tempo aqui passe menos vagaroso e tenha algo para me entreter, tal como Sísifo.
CID 10 - S91.3
Em delírio fui copo À espera do teu juízo Fui esquecida Largada no quarto Durante sua festa Virei cinzeiro Estive imóvel e atenta À espera do seu chute Cortei seu pé Fiz sangrar Causei toda sorte de infortúnios Da dor Ao tétano Nem cruzes ou credos puderam dar cabo Até seu pé ser amputado
a princípio
1.
Devido afins tipo Rpg rock and roll fast food feito em casa Bateu aquela impressão Que já o conhecia
2.
Afins lembra um leitor que Esses dias me abordou dizendo — Gostei sobremaneira dos seus poemas Ri e respondi — Sobremaneira é palavra finíssima
3.
Veio me encontrar vestido de terno Me deu uma baita dor de barriga Dessas que percorrem o corpo Como cantigas de ciganos
4.
Na época vestia casaco mostarda Calça boca de sino cintura baixa da opção Saudades desse shape Nem me importava pagar cofrinho
5.
Fumava um cigarro atrás do outro
Aliás meu relacionamento mais estável Até hoje é com o tabagismo
6.
Vinte e seis anos E me apareceu vestindo blusinha falsificada da Ecko
7.
Comprei muita roupa Pra ex na Uruguaiana Torcíamos pra ser caminhão que tombou E achávamos que ninguém reparava Porque tinha etiqueta
8.
Nunca fui romântica Ele veio me reclamar que Eu não dava a mão pra ele
É que minha mão sua muito na verdade
9.
Houvesse uma consciência semelhante à nossa No animal seguro de si Os lábios dele se curvaram em posição fecunda
Caso buscasse imagens de outro século para descrever
10.
Na fila da lanchonete do shopping Eu congelei Esse é o poema Eu congelei Fiquei paralisada enquanto ele Se aproximava
11.
Decerto não uma borboleta Porém algum outro mais demorado Bicho sem asas menos delicado Mais espaçoso mais muito mais patas Cravando minhas paredes do estômago
12.
— Yasmin reage — Não consigo — Ele vai achar que você não retribuiu porque não quer — Vai até ele e faz alguma coisa
13.
A língua inerte A boca dura Náusea — vou vomitar — vai até ele Centopeias me coçando Dei um passo
14.
— Ele nunca mais vai querer sair com você Aí a língua se moveu Num movimento meio espasmódico Rolou o jogo entre línguas A fila da lanchonete andou — Graças a deus Nosso pedido saiu
15.
Aquele frio na barriga Que eu só havia visto em filmes Até hoje me atordoa No final pensei fudeu Já amo esse homem
Yasmin Nigri (1990), carioca, é graduada em filosofia pela Universidade Federal Fluminense, onde atualmente cursa o mestrado na linha de estética e filosofia da arte. Feminista, cofundadora e integrante do coletivo Disk Musa, faz performances e trabalha com produção de conteúdo áudio visual buscando aliar arte a uma atitude política transformadora. O coletivo prepara sua primeira revista de arte e poesia feita só por mulheres para o segundo semestre de 2016. Integra também a Oficina Experimental de Poesia, que acontece toda quarta-feira no Méier. Tem poemas publicados nas revistas Mallarmargens, Escamandro, Germina e Jornal RelevO.
©alvaro gómez
» Imagens
Dara Scully. 1989. North of Spain. Photographer, writer, tree.
«Forest creature, winter child. I like birches and aspen leaves. In my other life, I was a white deer, a fox or a swallow. I've never flown. I drink milk tea and my favourite word is chrysalis. My heart belongs to Chopin and my body to the horses, but I've never ridden any. I read Jaeggy, Nabokov, Duras and Müller. I read because it saves me. Once, I had a black cat. In a parallel life I'm a pianist or ballerina, or maybe a Lewis Carroll little girl. I love poppy fields and blackberries in summer. If I have to choose a sound, I'd say: the wind shaking the branches of the trees. Or rain. I always wear dresses and man shoes. I've written since I was thirteen. I'm afraid of moths. I have six moles in my pale chest».
Dara Scully. 1989. Norte da Espanha. Fotógrafa, escritora, árvore.
"Criatura da floresta, filha do inverno. Gosto de bétulas e folhas de álamos. Em outra vida, fui um cervo branco, uma raposa ou uma andorinha. Nunca voei. Gosto de chá com leite e minha palavra favorita é crisálida. Meu coração pertence à Chopin e meu corpo, aos cavalos, mas nunca cavalguei. Eu leio Jaeggy, Nabokov, Duras e Müller. A leitura me salva. Uma vez, tive um gato preto. Em uma vida paralela, sou uma pianista ou bailarina ou então uma das meninas de Lewis Carroll. Amo campos de papoula e amoras no verão. Se tivesse que escolher um som, seria o do vento que balança os galhos das árvores. Ou da chuva. Sempre me visto com vestidos e calço sapatos de homem. Escrevo desde os treze anos. Tenho medo de mariposas. Tenho seis manchas no meu tórax pálido".
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