edição 39 | março de 2010
temas:  recomeço | platonismo | chuva

 

 

 

2 poemas
cida pedrosa

 

elipse

 

finco a chuva

entre tuas pernas

e espanto o estio

 

da pele fogem relâmpagos

da boca saltam trovões

nos olhos pairam coriscos

e um céu sertanejo

 

sulco a terra

neste plano horizontal

levemente oblíquo

 

caminho abissal

semeadura de contas

folhagem

 

teu verso coruscante

aflige ensandece espanta

 

o inverno se faz

em uma tempestade

quadrada

ao amor é dada

a calha

 

ah! quem sabe agora

o orvalho se move

e nos devolve as espigas

que colhemos durante a noite

 

 

 

tríade

 

quando chove

o verde em chamas

abala o mundo

 

o sol tímido recua

dando lugar

à euforia dos viventes

 

gotas de terra

gotas de chuva

gotas de sol

 

tríade da luz

e do afazer

 

o  sertão descansa

apaziguado

 

 

na deriva
florbela de itamambuca

 

essa enchente que deu me tirou tudo

geladeira, cochão, sala distar

corri num orelião que tem no bar

fui lá traz de uma ajuda, e dava mudo

 

nem quem tava no morro foi sortudo

o barranco enterrou fundo no mar

perdi meu filho, gente, perdi tudo

tô a deriva e não sei, mas vou voltar

 

agora somos 3 na mesma igara

são pedro, nem pra dar isplicação

dona emanjá? nem pra me olhar na cara

 

agua pra tudo quanto é direção

nesse rio que levou as minha vara

e agora pra pescar, gente, é com as mão

 

 

 
 
 

1 poema
jane sprenger bodnar

 

todo risco

vale a luz de vaga-lumes

sinalizando rodovias

canteiros de estrelas nos acostamentos

único acesso à chuva de astros

aos caprichos da primavera

a velocidade é cega

orquestra regida

por uma conspiração de luz.

 

 

 

  

 

antônio
julya vasconcelos

 

Eu era uma

e terminava onde terminam minhas mãos e cabelos e planta dos pés.

e aninhava quando em vez uma mariposa, um passarinho, uma gata da qual tiraram o útero.

 

Mas ontem aparei um corpo frouxo que me fecha e abre olhos leeentamente,

feixe de água doce, bem doce, mel de abelhas,

hidromel onde se pode mergulhar e ver os pés feito um pequeno polvo alerta.

platônico lábio que diz milhares de lararás, lirirís.

lhasa, yupanqui ao fundo llorando.

 

(eu)começo: duerme negrito.

 

 

poema para uma menina antiga
jussara salazar

 

recolhe a chuva para

que não fuja

com o tempo

amansa a chuva

para que não chore

sobre o mundo

        enchente

desmanche a pedra

inunde a mata

mergulhe até o fundo

por isso abraça a chuva

para que o instante

surja

e cada grão da terra

sem nenhuma guerra

seja flor e ouro

poro água corpo

 

 

 

  

 

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