edição 27
| junho de
2008
seppukus Na solidão do prostíbulo uma puta lutava para morrer e rasgou seu ventre com tanta força que um desconhecido filho lutava para nascer.
A noite cantava músicas estranhas enquanto o homem engravatado e só perfurou com uma faca o silêncio das suas entranhas.
Os rapazes se confrontaram com tanto ódio e dor que um beijou a barriga do outro com dois punhais de sangue e amor.
a nuca perfumada da menina O venerável superior Hans Daff, da abadia de Wassal, no balneário de Ó, põe os óculos redondos e, fingindo que folheia com unção o vago registro no caderno católico, não deixa de observar que, ali na sacristia, a nuca da menina é perfumada.
O venerável convida a menina para que se sente em seu colo.
Quinze anos tem Laurinha; o venerável espera que saiam todos e a mão com o grosso anel de ouro enfia-se no musgo entre as coxas da menina que ainda não sabe, que ainda não pode saber.
Os lábios molhados da menina, a nuca perfumada, o repique dos sinos. Alguns padres desfiam o rosário no átrio.
Aqui é o balneário de Ó envolto em neblina, onde atracam as barcas que descem o rio. Folhas do tamarindo caem, num abandono previsível, e, se erguermos um pouco os olhos, deparamos também com aquele céo antiqüíssimo e monótono. Contudo, o que se percebe mesmo é que o vento e os homens, as pedras e as mulheres só cuidam de si, nunca desconfiam que, nesse minuto, na abadia de Wassal, o venerável Hans força a menina a ficar de de quatro e a beijar o crucifixo.
filhos do sol nascente Hiroshi e Ono se plantaram, onde o sol mais nascia, lá na terra do sol nascente, e juraram amor eterno. Quando, em plena primavera, ela partiu para a terra distante, ele prometeu encontrá-la. Hiroshi lançou então, na terra alagada, as pequeninas sementes de arroz, enquanto Ono, no longe, paciente, esperava, e cantava. As sementes não germinaram, e Hiroshi não pôde cruzar os oceanos, lhe ofertar festa, nem amor. Hiroshi envergonhou-se, e lançou-se no abismo. Ele inteiro. Hiroshi sempre queria o muito dar. Até a vida. Ono, fértil, morreu, aos poucos, nos braços de um gaijin, que muito arroz colhia, e mais semeava, mas que dela nada ceifava.
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